Casais homoafetivos contam histórias de adoção. Spoiler: com final feliz!
No Brasil, existem mais de 9.300 crianças e adolescentes à espera de serem adotados, de acordo com o Cadastro Nacional de Adoção, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Do outro lado, existem pais e mães que buscam um filho para fechar uma espécie de elo e formar uma família. No meio destes, estão os casais homossexuais. Pela legislação brasileira, não há qualquer diferença no processo de adoção por casais gays. Até por isso, não há estatística que mostre quantos casais formados apenas por homens ou apenas por mulheres adotaram crianças no Brasil.
O ritual segue o mesmo de um casal heterossexual: inscrição, curso de preparação, avaliação psicossocial dos pretendentes, entrevista técnica, inscrição na fila de adoção, estágio de convivência e adoção definitiva.
O que a lei permite de maneira tão fácil, porém, não reflete o que a sociedade pensa. Uma pesquisa realizada pelo Ibope mostrou que 55% dos brasileiros são contra a união estável e a adoção de crianças por casais homossexuais.
Mas quem resolve deixar as opiniões contrárias de lado e entrar nessa corrida, só tem boas histórias para contar.
Jorge Luiz Brasil Ninho, 50 anos, jornalista, e Walter do Patrocínio, 54 anos, farmacêutico, de Niterói (RJ), são pais de Arthur, de 11 anos.
O nosso desejo de adotar uma criança nasceu há 14 anos. Chegamos a dar entrada no processo, mas uma série de contratempos nos obrigou a parar a busca. Esse desejo ficou quietinho até que 10 anos depois voltou com muita força. Mas eu tinha receio da nossa habilitação não ser aceita por sermos um casal homoafetivo.
Mesmo assim resolvemos ir em frente. Pensamos, no primeiro momento, em uma criança entre dois e quatro anos. Mas o tempo amadureceu nossas ideias e decidimos pela adoção tardia -- quando a criança tem mais de seis anos. Contamos com a ajuda de uma ONG que emite comunicados com listas de crianças nesse perfil disponíveis em todo país.
E foi aí que conhecemos o Suênio, que hoje é o nosso Arthur. Na época, com seis anos. Desde o primeiro contato, falamos abertamente sobre o fato de ter dois pais. E só levamos a adoção à frente quando tivemos certeza que ele poderia lidar bem com isso.
Foi um processo longo e burocrático em que passamos por momentos bem angustiantes. Um deles foi a expectativa pelo parecer do juiz porque ainda não havia tido um caso como nosso, de um casal homoafetivo adotando uma criança, na comarca de Niterói. E quando o Arthur chegou, tivemos que lidar com a sua adaptação. Na primeira semana ele estava muito agitado e até tentou fugir da escola que o matriculamos. Respiramos fundo e tentamos fazer com que se sentisse mais seguro e confiante.
Uma semana depois, ele estava mais calmo e feliz e começou a nos chamar naturalmente de pai. Nunca passamos por nenhuma situação de preconceito. E nem damos espaço para que isso aconteça. Se tem festa do Dia das Mães na escola, eu o deixo participar. Se tiver alguma atividade, como uma dança com as mães num palco, eu danço com ele. Não percebo nenhum desdém ou deboche. E se um dia acontecer, ele será enfrentado com muito amor. E se for ofensivo, levaremos à Justiça.
Essa criança mudou tudo em nossa vida. Absolutamente tudo. Emocionalmente, psicologicamente, financeiramente, socialmente, fisicamente. Vida pessoal? Esquece. Não existe mais. Hoje só existe a vida com ele. Mas não é ruim. Pelo contrário: é maravilhoso. Nem consigo me lembrar como era nossa vida sem ele. Arthur é o que faz nossos corações continuarem batendo e o que nos move a levantar da cama todos os dias para amá-lo."
Ninguém nos tratou diferente no processo de adoção
Monica Drumond de Araújo, 51 anos, administradora, e Jeanne Tostes Drumond, 52 anos, cirurgiã dentista, de Lagoa Santa (MG), são mães da Giovanna, de 6 anos, e da Lorena, de 4 anos
Eu e a Jeanne estávamos há oito anos juntas, quando decidimos que era hora de termos os nossos filhos. Como nós duas já éramos histerectomizadas, a adoção foi o caminho para formarmos nossa família. Passamos por todo o processo normal de habilitação. Nunca fomos tratadas de forma diferente por sermos um casal homossexual. Em alguns momentos, nos sentimos até beneficiadas.
Primeiro, recebemos a Giovanna. Na época ela era recém-nascida e foi emocionante pegá-la no colo pela primeira vez. A primeira noite foi muito complicada. Ela dormiu direto e eu e a Jeanne ficamos ao lado dela até o amanhecer acompanhando o sono e certificando de que respirava. Depois, decidimos entrar na fila novamente.
Passamos pelo processo mais uma vez e recebemos a Lorena, na época com nove meses. Preconceito é algo que não nos afeta. Elas cresceram com duas mães e encaram isso com muita naturalidade. Eu sou a Mamamon e a Jeanne é a Mamathih, ou simplesmente, mamães. Quando nos chamam, sabemos pelo tom de voz, qual mãe elas querem naquele momento.
Conversamos muito e contamos a elas que não nasceram das nossas barrigas, mas que outra pessoa as fez para nós. Conforme elas vão crescendo e as curiosidades aumentando, podemos ir nos aprofundando no assunto. A emoção e a alegria não dão espaço para outro sentimento que não seja paixão pelas nossas filhas. Moramos numa cidade pequena e aqui somos uma família muito querida, aceita e respeitada. Pensamos em dar para as meninas todos os valores e referências para que sejam pessoas de bem e que no futuro continuem mudando a vida das gerações que virão a partir da nossa, com amor, respeito, cuidado e proteção."
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