Como lidar com os novos modelos familiares?
Neste fim de semana surgiu, numa conversa com amigos, o tema das configurações familiares. A filha de uma amiga, de cinco anos, contou que um de seus coleguinhas tinha dois pais. Imediatamente, um dos presentes fez o seguinte comentário:
- Deve ser muito ruim ser filho de um casal gay! Comigo, que sou filho de pais heterossexuais, mas que não se casaram e nem moraram juntos, já foi complicado de lidar com o preconceito e a ignorância das pessoas.
Esse é o ponto: o preconceito. Ainda há pessoas com grande dificuldade em aceitar as novas configurações familiares, como se com isso pudessem eliminar da sociedade o que é diferente do socialmente aceito por eles. Mas o caminho não é esse.
Segundo dados do último censo do IBGE, de 2010, já são mais de 60 mil os casais gays que moram juntos. Porém, as relações homo-afetivas são apenas mais um exemplo dos novos arranjos familiares no Brasil. O modelo de casal heterossexual com seus próprios filhos deixou de ser dominante no país. Pela primeira vez, o levantamento demográfico identificou 19 tipos de laços de parentesco, indicando que os outros tipos de arranjos familiares estão em 50,1% dos lares, entre eles: casais sem filhos, pessoas morando sozinhas, três gerações sob o mesmo teto, casais gays, mães ou pais sozinhos com filhos, amigos morando juntos, netos com avós, irmãos e irmãs, e ainda a nova e famosa família “mosaico”, compostas por pais divorciados que voltam a se casar e vivem com os filhos do antigo casamento na mesma casa. Dados como esse mostram como o conceito de família hoje é muito abrangente. Ficar discutindo com base em conceitos antigos não é apenas improdutivo, é um retrocesso.
Qual é o papel da escola nessa discussão? A escola pode ajudar muito os alunos e pais a lidar com a diversidade das relações familiares e, principalmente, dar apoio para famílias com uma conformação diferente. Para isso, é fundamental que professores e funcionários estejam convencidos de que todas as relações amorosas são válidas e que qualquer criança quando é amada e cuidada pode ser feliz e saudável, independentemente do tipo de arranjo familiar que ela tenha.
Reações de rejeição e preconceito em virtude de um arranjo familiar pouco convencional pode causar isolamento social, revolta, agressividade e desatenção no aluno. Esses comportamentos dificultam a concentração e a aprendizagem e podem ser considerados um aviso para o professor intervir junto à turma, ou mesmo orientar os pais a buscar apoio especializado.
Para lidar com esse tema com os pais e alunos é preciso que professores e funcionários saibam como tratar a questão. É possível lançar um desafio pedagógico em que os diferentes tipos de família conhecidos pelos professores e funcionários sejam listados e solicitar que eles expliquem, em termos de configuração e modo de agir, o que há de diferente no comportamento dessa família. Essa é uma boa forma de desmistificar os tabus e mostrar que, se bem estruturado, qualquer um dos arranjos familiares apresentados pode contribuir para o desenvolvimento da criança ou jovem. Essa atividade também pode ser proposta para os alunos adolescentes, focando na apresentação das pesquisas realizadas e na valorização do que identificam como importante na convivência em casa, deixando claro que o apoio da família pode existir independentemente da forma como elas se configuram.
Para o trabalho com os familiares, sugiro que, após esse desafio com os professores, a escola faça uma palestra para falar sobre os novos arranjos familiares e fazer uma roda de conversa sobre o assunto, aproveitando, se o clima da conversa for de respeito à diversidade, para mostrar os tipos de família que existem na escola.
Já com os alunos pequenos, a melhor maneira é apresentar o assunto de forma natural e sem muitos detalhes. A criança consegue compreender que ele tem um pai e uma mãe, seu amigo tem dois pais, sua amiga duas mães, o outro coleguinha é criado pela vó, compreendendo que existem outras formas de família além da que ela participa.
Muitas escolas já incluem o tema “família” dentro de suas grades curriculares. Nesse caso, é só buscar uma forma dinâmica de conversar com os alunos: colagem de fotografias ou desenhos dos familiares para montar a árvore da família, além de outras formas de expressão em que as famílias sejam apresentadas e os alunos possam mostrar o que mais gostam na convivência familiar.
Gostei muito de um caso que encontrei na internet, em que a escola sugeriu a um aluno filho de pais gays que ele convidasse amiguinhos para frequentarem sua casa com o intuito de notarem que não existia diferença, a não ser o fato de que ele tinha dois pais. Para isso, a escola teve o cuidado de indicar uma família mais flexível e que lidava de forma aberta com o assunto. A conclusão da coordenadora pedagógica que trouxe a proposta foi de que, apesar de não ser uma questão fácil de ser trabalhada, é possível a escola ajudar a desenvolvê-la (veja aqui).
E na sua escola, como é trabalhada a questão da diversidade familiar?
Fonte: Nova Escola, por Maria Helena Vilela, diretora executiva do Instituto Kaplan onde coordena a área de Educação Sexual, 17/07/2014
Fonte: Nova Escola, por Maria Helena Vilela, diretora executiva do Instituto Kaplan onde coordena a área de Educação Sexual, 17/07/2014
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