Malafaia e os que se deixam pautar por ele

sábado, 9 de fevereiro de 2013

De amores como esse está pavimentado o chão do inferno

Por Míriam Martinho

Foi com muito desgosto que me vi obrigada a ver, em vídeo, a entrevista do famigerado Silas Malafaia no programa De frente com Gabi, do domingo último (03/01), pois sabia com o que iria me deparar (suas falas sobre homossexualidade são sempre as mesmas). Entretanto, como o assunto dominou a semana, segurei o estômago, fui à luta e assisti a performance do showman do obscurantismo.

Marília Gabriela até se saiu bem no primeiro bloco do programa ao questionar a fortuna adquirida pelo alcunhado pastor ao vender miragens de prosperidade para suas ovelhas. Acertou ao dizer que, enquanto o pastor já consta como milionário até na revista Forbes, seu tosquiado rebanho continua só vendo miragens e ainda por cima sem lã.

No segundo bloco, contudo, quando o assunto enveredou para o tema "homossexualismo", Gabi perdeu o controle da entrevista (ver ao fim da postagem). Começou fazendo a pergunta certa, ao citar a fala do presidente americano Barack Obama (18:10) que, em seu discurso de posse, afirmou:

"Nossa jornada não estará completa até que nossos irmãos e irmãs gays sejam tratados como qualquer pessoa."  

Em seguida, disse ao malacriado que, na igreja dele, Obama não teria sido eleito, o que o dito confirmou para logo em seguida tergiversar (desviar-se da pergunta subjacente à fala da entrevistadora que remetia à igualdade de direitos) e enveredar por seu discurso pronto sobre o "homossexualismo" ser um comportamento e não algo inato. Daí se seguiram falações disparatadas de Malafaia sobre genética acompanhadas posteriormente de outras tantas de igual teor na área religiosa e na área psicológica.

Quando Gabi tomou algum fôlego e tentou trazê-lo de novo para a área política, para o tema da igualdade de direitos, ele desandou a falar do PLC 122 (cuja redação se presta ao papo furado de que os LGBT querem privilégios e não direitos iguais), distorcendo mesmo seus pontos corretos. E ela se perde de novo, só recuperando um pouco às rédeas da entrevista aos 30 minutos mais ou menos quando discorre sobre a adoção de crianças por casais LGBT e, irritada com o besteirol proferido pelo pastor aloprado, consegue falar mais grosso com ele e se fazer ouvir. Sobrou, contudo, espaço ainda para Malafaia afirmar que não crê na capacidade de duas mulheres ou dois homens criarem crianças a contento e comparar homossexuais a bandidos (que ele "ama" apesar de bandidos).

Na mesma linha acuada de Marília Gabriela, foram as respostas dadas ao dito nos dias posteriores ao programa De Frente com Gabi que atingiu enorme audiência e levou a discussões acaloradas nas redes sociais. O geneticista Eli Vieira, doutorando pela universidade de Cambridge (Reino Unido) publicou um vídeo (ver abaixo), também com milhares de acessos, contestando as bobagens ditas por Malafaia e recuperando prováveis causas genéticas da homossexualidade já levantadas por pesquisadores. Outros pastores, do tipo inclusivo, contestaram, por sua vez, as edições que Malafaia faz da Bíblia, retirando trechos da mesma fora de seu contexto histórico, a fim de fundamentar seu heterossexismo. Por último, também o Conselho Federal de Psicologia (CFP) se pronunciou, a respeito das falas do pastor, contestando os "discursos que os colocam (os homossexuais) como inferiores, vítimas de sua própria existência.... discursos e práticas (que) são, então, ações de extermínios de subjetividades indesejadas."

Compreensíveis as respostas desse pessoal todo a Malafaia, tendo em vista que ele enveredou pelas áreas desses profissionais proclamando coisas do arco da velha como se realidade fossem. Entretanto, essas respostas se situaram também no campo das reações à pauta que ele conseguiu impor à Marília Gabriela e da qual a apresentadora em poucos momentos conseguiu se safar. De fato, é irrelevante se as pessoas são homossexuais de nascença ou por escolha, e a Bíblia não é a constituição do Brasil para poder justificar a exclusão seja de quem for de sua cidadania.  

Para desnudar a verdadeira motivação do discurso discriminatório de Malafaia contra os LGBT, o certo é tirá-lo do terreno pantanoso onde assenta seu discurso, uma mistura distorcida de bíblia com genética e psicologia, e trazê-lo para a área da política, dos direitos humanos.

Particularmente complicado e inclusive perigoso é buscar fundamentar direitos homossexuais com base em explicações genéticas, biológicas, para a homossexualidade. Tentar explicar o desejo homossexual por determinismo biológico, a fim de rebater a conversa de que a orientação sexual seria uma escolha racional por um comportamento supostamente negativo, pode motivar a futura criação de terapêuticas genéticas de cura da homossexualidade. Não mais "cura" psicológica mas sim física.

As ciências não são neutras ideologicamente e muitas aberrações já foram consideradas "científicas", a exemplo da eugenia, com pesquisadores "demonstrando", a partir de supostas características físicas, a inferioridade de certas "raças" (negros, indígenas) as quais, para aprimoramento da humanidade, deveriam ser eliminadas pela miscigenação ou via campos de concentração. Todo o cuidado nessa área é pouco.  

Para desnudar a verdadeira motivação das diatribes de Malafaia contra os LGBT, que é o preconceito pura e simples talvez até contra sua própria inclinação pessoal (ele leva o maior jeito de frequentador do Caneca de Prata, histórico bar de gays seniors de Sampa), o certo é tirá-lo do terreno pantanoso onde assenta seu discurso, uma mistura distorcida de bíblia com genética e psicologia, e trazê-lo para a área da política, dos direitos humanos. 

Independente do que ele pensa sobre a homossexualidade, como justifica sua discriminação contra os direitos civis de um segmento da população brasileira? Ele não é democrata, não crê num dos principais pilares das democracias modernas que afirma serem todos iguais perante a lei sem qualquer distinção? Ele quer sobrepôr a Bíblia às constituições democráticas que são fruto de um Estado Laico?  A visão dele de que as relações entre pessoas de mesmo sexo são imorais, um pecado, justifica cerceamento de direitos fundamentais dos "pecadores"? Outros tipos de "pecadores" têm seus direitos civis suspensos ou anulados devido a seus "pecados"? No que exatamente o casamento LGBT interfere nas famílias tradicionais? Se ele acha que liberdade de expressão é pregar contra os direitos civis de um segmento da população, ele discorda da criminalização dos símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo (artigo 20, § 1º, LEI Nº 7.716)?

Enfim, há inúmeros argumentos, dentro da área política, de direitos civis e humanos, com os quais acuar o pastor nas cordas do ringue da democracia. Malafaia é um hábil sofista e fala com a convicção própria dos fanáticos, aparentando coerência em seus discursos de pura má-fé. É como um mágico que, através de truques ilusionistas, faz as pessoas verem o que ele quer que vejam. Está faltando aos seus oponentes a capacidade de mostrar como a "mágica" é feita.

Nesse sentido, a resposta mais precisa ao perigoso discurso do pastor do maligno, de fato uma piada de mau gosto, ficou por conta da correspondente Chacota TV, numa edição primorosa e bem reveladora (ver abaixo) da entrevista do pastor à Marília Gabriela. Notem como, aos 01:05 do vídeo, o jeitinho do Malafaia o entrega. E não por causa da paródia.  

Seguem também a entrevista real do Silas à Gabi, a resposta do geneticista ao Silas, e a reveladora entrevista do Malafa à Chacota TV. Esperemos que, no próximo embate, as pessoas estejam mais aptas a não deixar o pastor pautar a conversa! 

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